Ecolocalização em morcegos e odontocetos - um acontecimento de evolução convergente!
O que é que alguns cetáceos e morcegos têm em comum ? No fim do artigo irá ser um expert neste tema, que "une" estes animais.
Escrito por: Marta Matos Tempo de leitura: 3min
Ecolocalização
Alguns animais possuem a capacidade incrível de, através de um mecanismo sensorial pelo qual emitem ondas ultrassónicas e recebem os seus ecos, localizar e identificar o que os rodeia. Por outras palavras, permite que os animais "vejam" através de sons! A este processo dá-se o nome de ecolocalização! Para percebermos um bocadinho melhor o que é a ecolocalização, recomendamos a visualização deste vídeo:
Alguns destes animais são, por exemplo, os morcegos e os odontocetos (cetáceos), como golfinhos, as orcas e os cachalotes.
Relação entre os morcegos e os odontocetos
Como já foi referido, tanto os morcegos como os odontocetos têm a capacidade de realizar a ecolocalização, e, apesar de ambos serem mamíferos, pertencem a ordens diferentes (Chiroptera e Cetacea, respetivamente), sendo que dentro destas, nem todos os animais possuem esta capacidade. Assim podemos concluir que esta característica foi desenvolvida independentemente nos dois grupos de mamíferos. Ou seja, trata-se de um caso de evolução convergente!
Esta observação suscitou a atenção de vários cientistas, que mais tarde estudaram este fenómeno. Entre eles podemos destacar Yang Liu[1] e Ying Li[2], que, juntamente com as suas equipas, desenvolveram estudos em torno da mesma ideia central: que esta característica provinha de mutações semelhantes no mesmo gene - o gene Prestin. Estas mutações aconteceram individualmente tanto nos morcegos como nos odontocetos!
Odontocetos
Estes animais têm a particularidade de possuírem dentição, distinguindo-os assim de outras espécies de baleias. Aliás, em inglês são regularmente referidos como toothed whales, que traduzindo à letra significa baleias dentadas.
O que é o gene Prestin?
Este é o gene que codifica a proteína Prestin, que se encontra ativa nas células auditivas dos ouvidos dos mamíferos. Esta proteína permite que os animais ouçam as ondas de altas frequências. Sabendo isto, cientistas chegaram à conclusão de que as mutações que ocorreram em ambos os grupos de animais, concederam-lhes a sensibilidade necessária para receberem e identificarem os sinais ultrassónicos.
Num dos estudos realizados, os cientistas construíram uma árvore filogenética baseada em análises das sequências de aminoácidos deste gene, através da qual conseguimos visualizar que os morcegos e os odontocetos aparentam ser parentes mais próximos do que na realidade são. Ou seja, com este estudo, os cientistas conseguiram corroborar a ideia de que realmente estes dois grupos de animais apresentam formas do gene Prestin semelhantes entre si - podendo a capacidade de ecolocalização destes animais dever-se à presença destas formas do gene.
Evolução convergente
Evolução de características semelhantes em diferentes indivíduos, de diferentes espécies, derivadas de pressões seletivas semelhantes.
Para ir mais além...
Foi a partir de um estudo realizado anteriormente, que se observou que, tanto os morcegos, como os odontocetos partilhavam versões semelhantes deste gene: Prestin! Para saber mais: https://www.pnas.org/content/105/37/13959.short
Formas de Ecolocalização
Então e em que parte da ecolocalização é que entra a proteína Prestin? Esta pergunta é uma para a qual já há resposta atualmente: afeta a forma como os animais recebem os sinais, verificando-se uma semelhança em ambos os casos.
Relativamente à forma como os animais emitem os seus sinais, é realizado de formas diferentes nos morcegos e nos odontocetos, visto que os habitats dos dois tipos de animais são bastante diferentes, os morcegos são terrestres e aéreos, enquanto que os odontocetos são marinhos. Assim faz sentido que as propagações dos seus sinais estejam adaptadas ao meio ambiente onde vivem.
Ecolocalização nos morcegos pode ser afetada pelas alterações climáticas
Com as alterações climáticas, vem o aumento das temperaturas, mas será que a ecolocalização nos morcegos será afetada? Estudos realizados apontam para que sim, realmente a capacidade e sensibilidade destes animais ouvirem os sinais ultrassónicos pode ser afetada por variações de temperatura ambientais. Contudo, nem todos os morcegos irão sofrer as mesmas consequências! Tudo aponta para que, dependendo de onde estes animais vivam - zonas tropicais ou temperadas - a sua sensibilidade para a ecolocalização varie de formas diferentes. Com um futuro aumento da temperatura média da Terra, morcegos que vivam em zonas temperadas serão mais suscetíveis a que possam perder alguma capacidade de ouvir tão bem os sinais sonares (resultando em não conseguirem detetar tão bem as suas presas), enquanto que morcegos que habitam em zonas tropicais serão capazes de aumentar a sua sensibilidade para ouvir estes sinais através de ecolocalização (serão capazes de detetar mais facilmente as suas presas)!
Referências:
[1] Y. Liu, J. A. Cotton, B. Shen, X. Han, S. J. Rossiter, and S. Zhang, "Convergent sequence evolution between echolocating bats and dolphins" Curr. Biol., vol. 20, no. 2, pp. 53-54, 2010
[2] Y. Li, Z. Liu, P. Shi, and J. Zhang, "The hearing gene Prestin unites echolocating bats and whales" Curr. Biol., vol. 20, no. 2, pp. 55-56, 2010
[3] Ed Young, (2010), "Echolocation in bats and whales based on same changes to same gene", National Geographic, disponível em: https://www.nationalgeographic.com/science/phenomena/2010/01/25/echolocation-in-bats-and-whales-based-on-same-changes-to-same-gene/ ; acedido a: 07/01/2021
[4] Helen Thompson, (2013), "Climate Change Affects Ultrasonic Bat Signals For Better, Worse", National Geographic, dísponivel em: https://www.nationalgeographic.com/news/2013/12/climate-change-will-affect-ultrasonic-bat-signals/ ; acedido a: 07/01/2021