Polvo

27-12-2020

Um animal que consta no nosso menu, mas terá coragem de o consumir depois de ler esta publicação?  

Escrito por: Simone Baseggio                                                                                                   Tempo de leitura: 5min

Enquadramento

O polvo encontra-se na Clade Lophotrochozoa, no Filo Mollusca. Para saber mais acerca das características comuns a todos os animais deste Clade, incentivamos a leitura da publicação: Filo Mollusca.

Conhecem-se aproximadamente 300 espécies, e encontram-se na Classe Cephalopoda e na Ordem Octopoda - característica por os organismos possuírem oito membros.

Características comuns e únicas

Não sendo exceção aos restantes moluscos, apresentam simetria bilateral, são protostómios, triblásticos e celomados. Os polvos, como todos os cefalópodes, têm um bico quitinoso, importante para triturar as presas mesmo antes de serem ingeridas. Têm também um sifão que intervém na locomoção e respiração. As suas brânquias cobrem uma grande superfície, permitindo a captação de muito oxigénio.

Ao contrário do que se verifica em espécies evolutivamente próximas, os polvos não têm concha, nem externa nem interna! São, na verdade, o único cefalópode que não a tem. Tal confere uma agilidade acrescida e permite-lhes esconder-se em fendas ou passar por locais apertados.

Os polvos habitam em profundidades muito variadas dos oceanos, variando de espécie para espécie.

Alimentação

Os polvos têm a capacidade de "provar" as suas presas antes de as comer, testando se são comestíveis ou venenosas. Tal é possível graças a ventosas localizadas nos tentáculos, que possuem células neurais capazes de interpretar sensações como o tacto e o paladar[1]. A boca está numa posição central relativamente a estes oito tentáculos. Após a sua inserção na boca, o alimento passa pelo bico e pela rádula, sendo assim triturado, com a ajuda das secreções das glândulas salivares. Segue pela faringe para o estômago, onde se dá digestão completa, com o auxílio de glândulas digestivas. Posteriormente vai para o intestino, onde os nutrientes se difundem para o sangue, antes das fezes serem excretadas pelo ânus[2]. 

Visão, cromatóforos e camuflagem

Os polvos têm um par de olhos extremamente desenvolvidos que lhes permitem conhecer detalhadamente o meio que os rodeia, entendendo a forma e a cor dos elementos que os circundam[3]. Aliado aos cromatóforos, células que contêm pigmentos responsáveis pela plasticidade fenotípica de vários animais, os polvos são capazes de se camuflar independentemente da cor do ambiente em que se encontram. Este mecanismo protege-os dos seus predadores naturais, como enguias, tubarões, ou peixes de grande porte[4].

Sistema circulatório e vantagem adaptativa da hemocianina

Quanto ao sistema circulatório, é fechado, e possuem três corações - dois deles bombeiam sangue para as brânquias e um deles para o resto do corpo. O sangue destes animais é de cor azul. Tal se deve à presença de hemocianina, a proteína que contém iões de cobre que liga e transporta átomos de oxigénio. É o equivalente à hemoglobina dos mamíferos, mas apresenta uma vantagem adaptativa a estes cefalópodes: permite-lhes sobreviverem numa gama de temperaturas bastante ampla. Pensa-se que tal se deva à baixa capacidade de migrações que estes animais apresentam, por terem um tempo de vida muito curto e se deslocarem maioritariamente no fundo do oceano, onde podem obter alimento, esconder-se camuflando-se ou infiltrando-se por entre falhas, reproduzir-se, e assim por diante. Não percorrem, assim, grandes distâncias. Deste modo, não são tão afetados por condições climatéricas adversas, alterações de correntes ou da temperatura da água[5].

Reservatório de tinta e fuga de predadores

Possuem um reservatório de tinta, que utilizam na fuga de predadores, quando se sentem ameaçados. O predador perde a capacidade de usar sentidos como a visão ou o olfato para localizar a presa. A composição é maioritariamente melanina, daí a cor escura, e muco[7].

Ciclo de vida

O tempo de vida dos polvos é muito curto, varia desde os seis meses aos cinco anos. O crescimento é extremamente rápido, sendo que o tamanho máximo que atingem é muito variado, desde 5 cm a 7 m. É extremamente curioso de notar que após "cumprirem o propósito de vida" e se reproduzirem, estes animais acabam por morrer. Os machos morrem pouco depois, enquanto que as fêmeas protegem os ovos até a sua eclosão, morrendo posteriormente.

Todas as espécies costumam depositar enormes quantidades de ovos, em fendas ou escondidos entre rochas, uma vez que apenas menos de um por cento dos embriões sobrevive. A fêmea protege-os e limpa-os regularmente. Após vários meses, dá-se a eclosão e os indivíduos entram na fase larvar[6]. Alimentam-se maioritariamente de outras larvas até atingirem um estágio juvenil, em que a dieta passa a consistir de crustáceos, poliquetas, outros moluscos menores, camarões e peixes, gradualmente atingindo a idade adulta e a maturidade sexual.

Durante o acasalamento, o macho possui um hectocótilo, um braço comprido que contém esperma, que insere no sifão da fêmea e conduz até os ovários. Nalgumas exceções, a fêmea pode guardar os espermatozóides e fecundar os óvulos posteriormente, mas, na maior parte dos casos, a fecundação dá-se no momento[7].

O macho morre brevemente após o acasalamento, contudo a fêmea gasta todas as suas reservas energéticas na proteção dos ovos, sem sequer se alimentar, certificando-se de que a descendência sobrevive[11].

Aconselha-se a visualização do seguinte vídeo, que representa precisamente este processo: https://www.youtube.com/watch?v=rkKNWE1n8Ac 

E a leitura do seguinte artigo: https://www.sciencedaily.com/releases/2018/09/180925140402.htm

Larva de polvo; Retirada de https://www.seasky.org/sea-gallery/sea-gallery-02-15.html
Larva de polvo; Retirada de https://www.seasky.org/sea-gallery/sea-gallery-02-15.html

Ampliação do olho de um polvo; Retirado de https://octolab.tv/octopus-vision/

Representação do sistema digestivo; Retirado de https://tolweb.org/accessory/Cephalopod_Digestive_System?acc_id=1993

Inteligência: sistema nervoso e capacidades cognitivas

Sabe-se bem que os polvos são capazes de surpreender, no que diz respeito a manifestações da sua inteligência. Primeiramente, têm 9 cérebros, ou melhor, um cérebro central, localizado na cabeça, que coordena o Sistema Nervoso Central, e oito gânglios, cada um num tentáculo. Assim, o polvo tem um controlo independente sobre cada membro e agiliza as informações sensoriais como o tacto, o olfacto e até mesmo a coloração (pelos cromatóforos).

As experiências realizadas neste âmbito foram inúmeras. Desde a abertura de frascos de duas peças, à rejeição de alimento podre, passando por labirintos ou resolução de tarefas para obter alimento, reconhecimento facial de seres humanos e utilização de objetos para diversos fins, como ferramentas ou esconderijos, por exemplo, existem muitas evidências para concluir que se trata de animais inteligentes[10].

Estudos até mostraram que, mesmo após disfarces ou mudas de equipamento e roupa por parte de um cientista que interage com o polvo, este o consegue reconhecer, não se assustar, nem libertar tinta ou fugir, pois recorda-se que teve uma experiência positiva com o sujeito[8][12].

Recomendamos a leitura da seguinte página do Museu de História Natural (do Reino Unido), que também contém vários vídeos: https://www.nhm.ac.uk/discover/octopuses-keep-surprising-us-here-are-eight-examples-how.html


Sabia que...

Os polvos têm a capacidade de regenerar tentáculos que tenham sofrido danos ou tenham sido amputados! 



Sabia que...

Por vezes diz-se que, ao reagirem a dado estímulo numa determinada maneira, os polvos apresentam uma espécie de personalidade. Foi demonstrado, contudo, que apesar das reações de um indivíduo poderem ser variáveis, elas não são consistentes, isto é, podem "ter dias" mais agressivos, outros mais calmos, outros em que parecem mais curiosos e interagem mais...[9]


Finalizando, eis um vídeo extenso que compreende inúmeros aspetos abordados:

https://www.youtube.com/watch?v=mFP_AjJeP-M

Referências

1- Lesté-Lasserre, C. (2020). Octopuses taste their food when they touch it with their arms. NewScientist. Disponível em: https://www.newscientist.com/article/2258515-octopuses-taste-their-food-when-they-touch-it-with-their-arms/. Acedido a: 03/01/2020.

2- Young, R. E., et. al. (2003). Cephalopod Digestive System Terminology. Trace of Life. Disponível em: https://tolweb.org/accessory/Cephalopod_Digestive_System?acc_id=1993. Acedido a: 03/01/2020.

3- Octolab.tv. (2019). Octopus vision - How they see what they see. Disponível em: https://octolab.tv/octopus-vision/. Acedido a: 03/01/2020.

4- Gilmore, B.S.R., et. al. (2016). Cephalopod Camouflage: Cells and Organs of the Skin. Nature Education, 9(2):1. Disponível em: https://www.nature.com/scitable/topicpage/cephalopod-camouflage-cells-and-organs-of-the-144048968/. Acedido a: 03/01/2020.

5- Dove, L. L. (2014). Why Is Octopus Blood Blue?. HowStuffWorks. Disponível em: https://animals.howstuffworks.com/marine-life/why-is-octopus-blood-blue.htm. Acedido a: 03/01/2020.

6- Vedantu. (Data desconhecida). Octopus Life Cycle. Disponível em: https://www.vedantu.com/biology/octopus-life-cycle. Acedido a: 03/01/2020.

7- Derby, C. D. (2014). Cephalopod ink: production, chemistry, functions and applications. Marine drugs, 12(5), 2700-2730. Disponível em: https://doi.org/10.3390/md12052700. Acedido a: 03/01/2020.

8- Library of Congress. (Data desconhecida). Can an octopus get to know you?. Disponível em: https://www.loc.gov/everyday-mysteries/item/can-an-octopus-get-to-know-you/. Acedido a: 03/01/2020.

9- Barley, S. (2010). HDTV reveals brainy octopus has no personality. NewScientist. Disponível em: https://www.newscientist.com/article/dn18640-hdtv-reveals-brainy-octopus-has-no-personality/. Acedido a 03/01/2020.

10- The Associate Press. (2019). 9 brains, 3 hearts: Some wild facts about octopuses. Disponível em: https://apnews.com/article/ba6e3fa5bb804565b9d6d666b6d40a73. Acedido a 03/01/2020.

11- University of Chicago Medical Center. (2018). The grim, final days of a mother octopus. ScienceDaily. Disponível em: www.sciencedaily.com/releases/2018/09/180925140402.htm. Acedido a 03/01/2020.

12- Hendry, L. (Data desconhecida). Octopuses keep surprising us - here are eight examples how. Natural History Museum. Disponível em: https://www.nhm.ac.uk/discover/octopuses-keep-surprising-us-here-are-eight-examples-how.html. Acedido a 03/01/2020.

Textos originais de Mafalda Martins, Marta Matos e Simone Baseggio 
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